Atraso de pagamentos por parte da administração pública – ações cuidados necessários
É bastante conhecido o rol de penalidades administrativas direcionadas às empresas que firmam ajustes contratuais perante a Administração Pública. As sanções por atraso nos prazos de entrega de bens e/ou serviços ou por falhas na execução do objeto resultam na aplicação de penas severas, ocorrendo, inclusive o risco da suspensão do direito de licitar e até mesmo a declaração de inidoneidade, de acordo com a gravidade do descumprimento cometido pelo contratado, tudo sempre em conformidade com as disposições constantes do artigo 87 da Lei nº 8.666/93.
Todavia, muito embora prevista em lei, a aplicabilidade de penalidades ao órgão contratante, especialmente em função do atraso no pagamento dos fornecimentos/serviços executados nem sempre é respeitada, gerando uma grave insegurança financeira à empresa contratada, a qual é notadamente marcada pelos prejuízos acumulados com a não aplicação da correção monetária aos valores pagos com atraso.
Observe-se que a obrigação de pagamento de multa com a aplicação da respectiva atualização financeira em caso de inadimplemento da Administração possui, inclusive, normativa inserta no artigo 55, inciso III da Lei nº 8.666/93:
“Art. 55. São cláusulas necessárias em todo contrato as que estabeleçam:
III – o preço e as condições de pagamento, os critérios, data-base e periodicidade do reajustamento de preços, OS CRITÉRIOS DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA ENTRE A DATA DO ADIMPLEMENTO DAS OBRIGAÇÕES E A DO EFETIVO PAGAMENTO;”
Enfim, a Lei nº 8.666/93 determinou de forma bastante clara a existência de cláusula contratual que impõe penalidades à Administração Pública que não mantiver em dia seus pagamentos.
Apesar disso, a previsão de tal tipo de disposição em que se aplicam penalidades à entidade pública é bastante incomum. Existe uma grande resistência por parte dos gestores e administradores públicos em admitir em seus editais a previsão que imponha o pagamento de multa nos casos em que os valores devido ao contratado não sejam devidamente adimplidos na forma acordada em contrato.
Isso porque, para muitos, ainda, existe a equivocada ideia de que o ente público exerce uma condição de supremacia quase monárquica em relação ao particular contratado. O simples fato de a Administração Pública estabelecer para si quaisquer penalidades por descumprimento contratual, ainda que prevista em lei, é algo impensável para um grande número de agentes públicos.
Como se não bastasse isso, não se deve desconsiderar uma realidade consolidada há anos no âmbito das contratações administrativas, qual seja, a dificuldade da Administração em efetuar os pagamentos em dia aos seus contratados pelos serviços ou fornecimentos prestados.
É tarefa praticamente impossível encontrar fornecedor ou prestador de serviço a entes públicos que já não tenham passado pelo dissabor de ver seus recebimentos atrasados pelo órgão contratante. Isso, em tese, não deveria ocorrer, na medida em que ao promover uma licitação o gestor público precisa obrigatoriamente dispor de dotação orçamentária para custeio das despesas que serão realizadas.
Entretanto, em alguns casos, a inadimplência do ente público contratante é rotineira, trazendo efeitos nocivos e devastadores às empresas contratadas, até porque estas se encontram submetidas a custos fixos e carga tributária que não podem ser simplesmente postergadas, sob pena de consequências graves à própria manutenção da sociedade empresarial.
Isso sem falar que qualquer atraso na execução do objeto contratado pela Administração Pública também poderá gerar penalizações ao particular que vão desde uma multa até o impedimento de licitar e contratar com quaisquer entidades públicas.
Ironicamente, ao mesmo tempo em que a Administração é severa quanto aos atrasos contratuais do contratado é extremamente flexível em relação ao seu inadimplemento.
Chega-se ao cúmulo de algumas entidades estabelecerem um procedimento extraoficial para pagamento de seus fornecedores/prestadores de serviço já considerando como natural o prazo de 90 (noventa) dias como o limite máximo possível para atraso. Isso porque, de acordo com o inciso XV do artigo 78 da Lei nº 8.666/93, é causa de rescisão contratual ou suspensão das obrigações pelo contratado o atraso dos pagamentos devidos pela Administração superior a 90 (noventa) dias.
Com efeito, ao se aproximar o limite de tempo disposto em norma para pagamento em atraso ao contratado sem ensejar a rescisão ou suspensão do fornecimento ou serviço, a Administração efetua o pagamento. E tudo isso, diga-se, na maior parte das vezes sem qualquer atualização monetária dos valores pagos em atraso.
O inadimplemento por parte da Administração Pública deveria ser algo excepcional, não usual e, essencialmente, temporário, e não em subterfúgio para exercício de um alegado controle dos gastos públicos. Se o serviço ou fornecimento foi licitado é porque existia, minimamente, a previsão de dotação orçamentária e/ou planejamento financeiro prévio para seu custeio.
Do mesmo modo, se esse mesmo serviço ou fornecimento foi devidamente prestado pelo contratado, nada mais justo que a contraprestação pecuniária seja paga pelo ente público contratante na forma em que disposta no ajuste administrativo celebrado entre as partes.